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/ quinta-feira, maio 2, 2024
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STF considera tese da “legítima defesa da honra” inconstitucional em feminicídios

Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
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Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consideraram inconstitucional o uso do argumento da “legítima defesa da honra” em feminicídios julgados no tribunal do júri, em decisão tomara por unanimidade na corte.

O termo é empregado para justificar atos cometidos por réus em casos de feminicídio nos julgamentos por tribunal do júri (também conhecido como júri popular), responsável por julgar crimes dolosos contra a vida.

Os ministros acompanharam o voto do relator do caso, ministro Dias Toffoli. Em junho, já havia maioria para considerar inconstitucional o uso do argumento.

Pela decisão, a “legítima defesa da honra” não poderá ser usada por advogados, policiais ou juízes — de forma direta ou indireta.

O entendimento da Corte exclui a legítima defesa da honra do rol de argumentos abrigados pela “legítima defesa”. Segundo o Código Penal, age em legítima defesa quem, “usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

“É límpido que a chamada ‘legítima defesa da honra’ não encontra qualquer amparo ou ressonância no ordenamento jurídico pátrio”, disse Toffoli em seu voto, apresentado no final de junho. “‘Legítima defesa da honra’ não é, tecnicamente, legítima defesa”.

Segundo o relator, a tese corresponde a um “recurso argumentativo retórico odioso, desumano e cruel” que é “utilizado pelas defesas de acusados de feminicídio ou agressões contra mulher para imputar às vítimas a causa de suas próprias mortes ou lesões, contribuindo imensamente para a naturalização e a perpetuação da cultura de violência contra as mulheres no Brasil”.

Além disso, a defesa não poderá usar o argumento e depois pedir a anulação do júri popular. Ou seja, o acusado não pode agir de forma irregular e depois tentar se beneficiar disso.

Os ministros concluíram ainda que tribunais de segunda instância poderão acolher recursos pela anulação de absolvições, caso estas tenham sido baseadas na tese. A Corte entendeu que, se o tribunal determinar novo júri, não vai ferir o princípio da soberania dos vereditos dos jurados.

Ao votar, a ministra Cármen Lúcia relembrou, sem citar nomes, o caso da socialite Ângela Diniz, assassinada por Doca Street. Doca era companheiro de Ângela, e os dois haviam terminado o relacionamento pouco antes do crime.

Em dezembro de 1976, ele matou Ângela com quatro tiros no rosto durante uma discussão do casal em Búzios, no Rio de Janeiro, onde a socialite tinha uma casa na Praia dos Ossos. À época, Doca alegou “legítima defesa da honra” e disse ter matado Ângela “por amor”.

A ministra também citou leis da época do Brasil Colônia, que atribuíam ao homem o poder sobre o corpo e a vida da mulher. Argumentou que, ainda atualmente, as mulheres continuam a ser tratadas como “coisas” e que nesta condição, devem “se submeter ao poder de mando de alguém”.

Cármen afirmou que o tema dialoga com a questão da dignidade humana em “uma sociedade que ainda hoje é machista, sexista, misógina e mata mulheres apenas porque elas querem ser o que elas são, mulheres donas de sua vida”.

A presidente do STF, ministra Rosa Weber, argumentou que a tese não é compatível com uma sociedade livre e democrática. “Simplesmente não há espaço, no contexto de uma sociedade democrática, livre, justa e solidária, fundada no primado da dignidade da pessoa humana, para restauração dos costumes medievais e desumanos do passado”, afirmou.

De acordo com a ministra, a formação social baseada na “ideologia patriarcal” pressupôs uma espécie de superioridade masculina, a partir da qual se “legitima a eliminação da vida de mulheres” para reafirmação de papéis sociais e do que consideram ser “sua honra”.

A ação foi movida pelo PDT. Em fevereiro de 2021, Toffoli já havia suspendido o uso do argumento, em decisão liminar (provisória), confirmada agora pela Corte.

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